Casamento é aliança
Não temos todos o mesmo Pai? Não fomos todos criados
pelo mesmo Deus? Por que será então que quebramos a aliança dos nossos
antepassados sendo infiéis uns com os outros? Judá tem sido infiel. Uma coisa
repugnante foi cometida em Israel e em Jerusalém; Judá desonrou o santuário que
o Senhor ama; homens casaram-se com mulheres que adoram deuses estrangeiros.
Que o Senhor lance fora das tendas de Jacó o homem que
faz isso, seja ele quem for, mesmo que esteja trazendo ofertas ao Senhor dos
Exércitos. Há outra coisa que vocês fazem: Enchem de lágrimas o altar do
Senhor; choram e gemem porque ele já não dá atenção às suas ofertas nem as
aceita com prazer.
E vocês ainda perguntam: "Por quê? " É porque
o Senhor é testemunha entre você e a mulher da sua mocidade, pois você não cumpriu
a sua promessa de fidelidade, embora ela fosse a sua companheira, a mulher do
seu acordo matrimonial. Não foi o Senhor que os fez um só? Em corpo e em
espírito eles lhe pertencem. E por que um só? Porque ele desejava uma
descendência consagrada.
Portanto, tenham cuidado: Ninguém seja infiel à mulher
da sua mocidade. "Eu odeio o divórcio", diz o Senhor, o Deus de
Israel, e "o homem que se cobre de violência como se cobre de
roupas", diz o Senhor dos Exércitos. Por isso tenham bom senso; não sejam
infiéis.
(Malaquias 2:10-16)
Introdução
O
casamento é um relacionamento pactual estabelecido por Deus e seus votos são
feitos a Deus. O casamento cristão é, por mandado do Criador, espiritual. Sua
finalidade não é apenas fazer os seres humanos felizes.
Seu
propósito é glorificar a Deus e fazer com que a geração seguinte conheça a glória
de Deus. É preciso lembrar, entretanto, que o casamento une duas criaturas
caídas, dois filhos pecadores de Adão.
I.
Casamento é unidade
Na Bíblia,
casamento é sinônimo de unidade, tornar-se um. Nessa síntese, nenhum dos dois
torna-se mais fraco, ou menor do que o outro. Nenhum dos dois perde nada de
valor, mas essa fusão não é fácil. O inimigo dessa união é o orgulho, a busca
do interesse próprio. Autonomia nunca produz unidade.
Quando Josué
declarou, “Eu e a minha casa serviremos ao Senhor” (Js 24.15), fez isso no
contexto da renovação do pacto. Josué desafiou o povo a servir ao Deus da
aliança; caso contrário, acabariam servindo a deuses estranhos, mas não caberia
nenhuma mistura. E a decisão era assunto de família, assunto de comunidade.
Ao afirmar ao povo
que eles não poderiam servir ao Senhor, porquanto é Deus santo e zeloso (Js
24.19), Josué estava pressionando o povo a compreender que não podemos
satisfazer as exigências da santidade de Deus. Da mesma forma, o casamento é a
união de duas criaturas caídas que não têm capacidade de servir ao Senhor. Não
temos poder em nós mesmos para vencer o orgulho e alcançar a união que ilustra
o amor de Jesus. O orgulho não é biodegradável. Só a cruz é morte certa para
nosso orgulho. Nosso único direito à misericórdia do Pai é o sacrifício do
Salvador. O orgulho divide, mas a cruz une. Para nosso lar ser um seguro abrigo
da graça, onde o Rei Jesus é honrado e servido, é preciso haver união no
casamento.
Divisão no
casamento é evidência de mistura com deuses estranhos. Seja esse deus um vício,
paixão mundana, ganância, egoísmo, ou expectativas exageradas, em última
análise é a soberba da vida e corrói a união.
II. Casamento é pacto
III.
O casamento é uma
aliança, um pacto. O casamento cristão deve existir dentro da esfera do pacto,
de acordo com a rubrica do pacto e sujeito às regras do pacto.
“O casamento é uma
aliança estabelecida por Deus e vivida diante dele, para expressar
simbolicamente a união de Deus e o seu povo por meio de um amor real. Deus nos
colocou nesse vínculo quando nos criou à sua imagem.
Ele manteve essa
ligação entre ele mesmo e nós, enriqueceu-a e abençoou no princípio e vai
abençoá-la por todos os tempos.”
O profeta
Malaquias falou a um povo que duvidava do amor de Deus e que, por isso, tinha
relaxado na obediência. Então o relacionamento se corrompeu.
A missão de Malaquias era lembrar a esse povo
o amor pactual de Deus e as obrigações pactuais do povo. Malaquias começa com
uma advertência, em que o Senhor declara ao povo que o tem amado, mas o povo
pergunta em quê (Ml 1.1,2). Deus responde fazendo Israel lembrar-se do pacto e
aponta a raiz do problema: sacerdotes infiéis e falta de conhecimento da
Palavra de Deus (Ml 2.7,8).
Essa corrupção se
espalhou pelo povo. Ao quebrarem o pacto com Deus, seus relacionamentos humanos
também sofreram (Ml 2.10-16). Os homens quebraram a fidelidade a Deus,
casando-se com mulheres pagãs. Deus chamou-os ao arrependimento e reafirmou a
promessa do pacto (Ml 3.17,18; 4.1-6). Josué tinha razão. Nós não somos capazes
de servir ao Senhor, mas Deus volta os corações dos pais aos filhos e os
corações dos filhos aos pais. O evangelho da graça realiza por nós e em nós o
que nós não podemos fazer por nossa própria força. O resultado é solidariedade
em família.
Malaquias avisou
que a integridade da comunidade pactual fica ameaçada quando as alianças
matrimoniais são quebradas. A comunidade da aliança tem um investimento no
casamento e o casamento precisa da instrução e sustentação da comunidade. Quando
o povo de Deus não segue os princípios e a regras pactuais, todos sofrem. Não é
sem razão que Paulo ensinou Tito a exortar as mulheres mais velhas, piedosas,
para que instruíssem as jovens recém-casadas a amarem seus maridos e filhos (Tt
2.3-5).
O casamento
cristão deve existir dentro da esfera da comunidade pactual. O compromisso é
com o Senhor (Ml 2.14,15). A rubrica é o princípio da graça: “Transbordou,
porém, a graça de nosso Senhor” (1Tm 1.14,15). A regra é a lei soberana do amor
(Tg 2.8).
III. As condições do pacto
O exemplo de Rute
e Boaz ilustra o ensino básico de um casamento pactual. Quando os israelitas
conquistaram a terra prometida, cada família ganhou uma propriedade.
A terra fazia
parte da promessa e a esperança do povo era que seus filhos vivessem na terra
até a chegada do Messias. A terra era sua garantia de compartilhar a glória do
Messias.
O livro de Rute
começa com uma notícia de fome em Israel (Rt 1.1,2). Elimeleque foi buscar
alívio em Moabe, mas aparentemente morreu ao chegar ali. Sua esposa e seus dois
filhos continuaram em Moabe, os filhos se casaram as moabitas Orfa e Rute
(v.4). Malom e Quilion também morreram, “ficando, assim, a mulher desamparada
de seus dois filhos e de seu marido” (v.5). Noemi decidiu então voltar a
Israel.
Noemi faz lembrar
as mulheres citadas em Tito 2, exortadas a ensinarem as jovens recém-casadas a
amarem seus maridos e filhos. Quando Noemi incentivou as noras a ficarem em
Moabe, Orfa voltou, mas Rute se apegou a Noemi e ao Deus de Noemi (Rt 1.16,17).
Foi o Deus da
fidelidade pactual que Rute abraçou. De algum modo, através do complexo
relacionamento de sogra e das dificuldades da viuvez, Noemi refletiu a bondade
de Deus para Rute. Ir com Noemi significava, para Rute, identificar-se com o
povo do pacto.
Quando as duas
viúvas chegaram a Belém, Rute foi pedir permissão para apanhar espigas dos
ceifeiros. Deus soberanamente dirigiu Rute ao campo de um homem que honrou a
exigência pactual de cuidar dos estrangeiros, órfãos e viúvas (Dt 24.19,22).
O dono do campo
perguntou pela identidade de Rute e se emocionou com a escolha dela,
oferecendo-lhe suprimentos e provisão nos campos dele. No diálogo que tiveram
nessa ocasião, refletiram a graça do pacto um ao outro: “O Senhor retribua o
teu feito, e seja cumprida a tua recompensa do Senhor, Deus de Israel, sob
cujas asas vieste buscar refúgio” (para o diálogo todo, ver Rt 2.8-13).
Noemi ficou muito
alegre quando soube das notícias. É preciso observar a natureza corporativa do
pacto para entender a alegria de Noemi. No povo de Deus um tinha
responsabilidade para com o outro. Eram guardadores de seus irmãos e havia
dispositivos para reaver a propriedade perdida e para o cuidado das viúvas (Lv
25.14,15; Dt 25.5,6).
Noemi treinou Rute
nas maneiras do pacto. Rute seguiu as instruções de Noemi (Rt 3.8-11) e o
resultado foi que Boaz resgatou a terra a casou-se com Rute (Rt 4.9-11). Rute e
Boaz foram os bisavós de Davi e estão na lista da genealogia de Jesus (Mt 1.5).
Essa história tem
elementos pactuais importantes:
1) pessoas com os
requisitos de uma comunidade pactual: os vínculos com lugar, outras pessoas e
princípios;
2) uma mulher mais
velha exercendo seu chamado para ser mãe espiritual de mulheres mais novas;
3) uma mulher mais
jovem que aprendeu a se apegar ao Deus da fidelidade pactual;
4) um homem
compassivo que protegeu uma estrangeira e proveu suas necessidades;
5) um casamento
pactual que trouxe bênção à comunidade, porque foi em Belém que nosso
Resgatador-Parente nasceu.
O elemento
essencial dessa história é que Rute e Boaz abraçaram o pacto porque eles foram
abraçados pelo Deus do pacto. Jesus estendeu o canto de sua capa de justiça
sobre nós e agora podemos decidir como Josué (Js 24.15), porque o Senhor nos
cobriu de vestes de salvação e nos envolveu com o manto de justiça (Is 61.10).
Se entendermos
que, apesar de nossa condição miserável, fomos abraçados pela graça,
abraçaremos nosso cônjuge em graça. A humildade substituirá a arrogância e
passaremos a servir, em vez de esperarmos ser servidos. Os dois começarão a
crescer em unidade. Nossos casamentos começarão a refletir a magnificência da
graça, em lugar da mediocridade do egoísmo.
O começo desse
caminho é o quebrantamento. Precisamos fazer a oração de confissão de Davi (Sl
51). Davi teve de arcar com as consequências do seu pecado. A criança morreu.
Davi se arrependeu, prestou culto ao Senhor e depois consolou sua esposa. Uma
evidência visível do arrependimento verdadeiro é a percepção das necessidades
do outro e o entendimento de como tocar essas necessidades com o graça. O
arrependimento nos desprende do orgulho e nos liberta para a unidade.
IV. O caminho para a unidade
Autoridade e
submissão são os dois meios ordenados por Deus para se alcançar unidade no
casamento. “… enchei-vos do Espírito … sujeitando-vos uns aos outros no temor
de Cristo. As mulheres sejam submissas ao seu próprio marido… Maridos, amai
vossa mulher, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela”
(Ef 5.17-25). O único dragão a ser morto é o orgulho. A jornada nos leva à
cruz.
A autoridade está
implícita na declaração de Josué: “… escolhei, hoje, a quem sirvais … Eu e a
minha casa serviremos ao Senhor” (Js 24.15). A autoridade bíblica é a humildade
em ação. É colocar o bem da outra pessoa acima do seu próprio.
Submissão nada tem
a ver com posição ou opressão. Homens e mulheres são iguais. A submissão tem a
ver com função – a maneira como Deus diz que o casamento tem de funcionar. A
fonte da submissão é a humildade perante Deus e um coração que aceita a ordem
familiar por amor à glória de Deus.
Em última análise,
essas atitudes dizem respeito à nossa fé em um Deus soberano, que nos ama além
de qualquer coisa que possamos sondar.
Conclusão
A única coisa que
pode unir duas criaturas pecaminosas é a paixão pela glória de Deus. A graça
acende essa paixão, que é abastecida à medida que vivemos na esfera da
comunidade da graça, pela rubrica da graça, e sob o governo do amor pactual (Fp
2.12-16).
O fato do
casamento ser uma união instituída por Deus e ser a base e referência do pacto
que Deus instituiu com o seu povo, não retira nem impede o esplendor e ardor
que deve temperar o casamento; afinal, foi o Senhor mesmo quem ordenou que
homem e mulher fossem dois numa só carne, e isto só se constrói no vínculo da
paixão. E dentro de um ambiente de mútua fidelidade e amoroso respeito pelo
outro, esse ardor também é benção de Deus.